MIRANDA, Clara Feldman de & MIRANDA, Márcio Lúcio de, Construindo a relação de ajuda. 7.ed. Belo Horizonte: Editora Crescer, 1991, 204 páginas.
O texto de Clara Feldman e Márcio Lúcio de Miranda traz ensinamentos práticos para conselheiros e qualquer pessoa que deseja ajudar alguém em situação difícil.
Todas as pessoas têm alguém importante com quem viveu ou vive exerce uma influência significativa em sua vida. Na convivência pode se encontrar pessoas que se destacam num relacionamento de ajuda. Há dois personagens básicos numa relação de ajuda: o ajudado e o ajudador.
Psicoterapeutas interessados em ajudar seus clientes, descobriram que a terapia, se não for aplicada de forma correta, pode prejudicar. Também concluíram que a solução do cliente não está no psicoterapeuta, nem nas técnicas usadas por ele, e que algumas posturas do terapeuta em relação ao cliente, influenciam nos resultados. Na verdade, para se obter bons resultados numa terapia, é necessário ajuda mútua entre cliente e terapeuta.
Quem precisa de uma mudança interior e não consegue, embora não saiba, está sempre querendo mudar as coisas externas na inconsciente intenção de se satisfazer. Essa frustração ou falta de realização pode ser uma carência de aceitação e amor incondicional. O problema pode ser de origem física, emocional ou intelectual, mas o principal problema é vencer o obstáculo de reconhecer a necessidade de ajuda. Vencido este obstáculo começa uma nova caminhada de “onde está”, para “aonde quer chegar” até “chegar lá”. Um ajudador não nasce pronto, mas é simplesmente alguém que já recebe ajuda e aprendeu a se auto-ajudar, sabendo enfrentar sabiamente os desafios da vida. Como consequência disso aprende a ajudar os outros porque sabe fazer algo imprescindível para ajudar: amar.
O ambiente físico onde ocorrerá a conversa de ajuda é de extrema importância para que o ajudado se sinta bem à vontade para se abrir. Quando o diálogo acontece em um lugar adequado há um sentimento de valorização, privacidade, conforto e segurança que fazem com que tanto ajudado como ajudador rompam todas as barreiras para uma ajuda mútua.
Ao se encontrar com alguém que precisa desabafar, o confidente deve receber a pessoa calorosamente, demonstrando interesse pela pessoa e a situação em que vive. Alguns gestos são significativos, como saber o nome da pessoa e procurar não esquecê-lo, cumprimentar de forma carinhosa sempre, mostrar que não se esquece da pessoa, ou até mesmo atender alguma necessidade física imediata.
Durante uma conversa a expressão corporal transmite muitas mensagens que não são ditas por palavras, assim, o que está ouvindo pode dizer muita coisa através do seu corpo (que não mente), transmitindo disponibilidade e interesse por quem fala. Algumas posições como se aproximar, ficar frente a frente, olhar nos olhos da pessoa, ter a fisionomia receptiva demonstrando concentração, fazer um aceno com a cabeça e um toque com as mãos, podem ter um grande significado, não em palavras, mas em sentimentos.
A linguagem corporal é mútua. Da mesma forma que o ajudador transmite mensagem ao ajudado enquanto ouve, acontece também do ajudado para o ajudador. Então este precisa estar atento e observar as expressões e reações do ajudado, olhando a aparência e o comportamento. Dessa forma é possível entender muita coisa que a pessoa não consegue expressar claramente por palavras, podendo deduzir a disposição física, o que sente, a prontidão em agir, como se relaciona com os outros e a coerência entre o que fala e faz ou demonstra.
Algo indispensável para ajudar o próximo é escutar a pessoa. Poucas são as pessoas que sabem fazer isso, talvez porque são falantes demais, porque nunca foram escutadas ou por não querer ouvir para não ter o que falar.
De acordo com a intimidade que se tem com uma pessoa é a intensidade das conversas com elas, por exemplo: com alguns só se fala superficialmente, assuntos sem importância e por educação; há quem só fala de outras pessoas; com outras se discute opiniões e ideias sobre diversos assuntos; com alguns já se fala sobre emoções e sentimentos pessoais; e com poucos pode haver liberdade para se abrir com disposição para contar e ouvir tudo.
Ouvir realmente não é fácil, é preciso exercitar essa virtude aprendendo a ficar calado, não interromper, não se distrair com coisas externas ou interiores e principalmente, depois de ouvir, evitar fazer um julgamento que censure a pessoa ajudada ou imponha a vontade e opinião do ajudador.
Só de ouvir já é uma grande ajuda para quem precisa de uma companhia e não tem com quem desabafar. Além disso, o objetivo deve ser a compreensão. É possível detectar o problema real do ajudado quando se percebe que em sua fala ele repete muitas vezes o que o incomoda mais, se destacando entre outros fatores. Também é possível deduzir o que o ajudado quer dizer implicitamente através de suas palavras.
Depois de escutar é hora de corresponder a expectativa do ajudado e falar. Essa resposta é uma afirmação de compreensão. Mas antes de resolver o problema, a primeira coisa que o ajudado e ajudador precisam saber é se este compreende aquele, mesmo que para isso precisem tentar várias vezes. Então a principal resposta que o ajudado necessita ouvir é: “eu entendi você”. Por isso é importante que o ajudador exponha para o ajudado como compreendeu a questão, resumindo o que ele disse.
Toda palavra ou ação expressa sentimentos. Quem procura ajuda quer ser entendido em seus sentimentos e quem ajuda deve estar atento a esses sentimentos, para qualificá-los e responder ao ajudado que sabe o que está sentindo.
Se o ajudador souber responder o que entendeu das palavras e o porquê dos sentimentos do ajudado, isso fará com que a conversa continue sem medo de incompreensões. Essa resposta deve ser empática (evitando a simpatia e antipatia), mostrando para o ajudado que ele não está só e que alguém acredita nele.
É possível transmitir compreensão do conteúdo e do sentimento através de uma imagem comparativa, que em linguagem figurada expressa claramente aquilo que a pessoa ajudada disse e sentiu.
Muitas vezes, mesmo quando a pessoa procura ajuda não consegue falar muito, não se expressa claramente ou de tão emocionado prefere ficar calado. Então o ajudador ao observar as expressões de comportamento do ajudado, pode lhe dizer o que está percebendo ou o que está transparecendo no semblante do ajudado, lhe perguntando se realmente é isso que o incomoda. Assim o ajudador pode abrir caminho para que o ajudado o identifique o seu problema e se abra contando o que está acontecendo.
A expectativa de quem procura uma ajuda é receber a solução de seus questionamentos, então quem vai dar essa resposta deve pensar bem sobre os sentidos da pergunta, a fim de falar sabiamente. Às vezes a resposta pode ser uma pergunta ou uma suposição que abra caminho para um diálogo mais intenso, levando o próprio ajudado a encontrar a causa e a solução do problema.
É bom saber que somente a própria pessoa carente de ajuda é que sabe o que realmente está acontecendo e o que é melhor para ela. A função do ajudador é conduzir o ajudado a essa conclusão.
Outra forma de fazer o ajudado se abrir para falar o que sente é o ajudador expressar seus sentimentos diante da situação do ajudado, mostrando-lhe solidariedade e fazendo-o se sentir bem à vontade para dizer o que o faz sofrer, para um amigo e companheiro que lhe compreende.
Durante o diálogo de ajuda é necessário conduzir o ajudado a assumir sua responsabilidade no problema. Não culpá-lo, mas fazê-lo entender de acordo com suas possibilidades, que não é apenas vítima e pode agir para vencer. Enquanto a culpa é dos outros, o ajudado não tem nada a fazer a não ser se lastimar, porém quando assume sua participação, encontra formas de resolver seus problemas.
Além de descobrir a causa do problema é preciso saber qual o objetivo a ser alcançado, e como começar essa nova caminhada. A partir da personalização o ajudado é estimulado a agir e o ajudador pode expor quais alternativas para ele e orientá-lo a escolher corretamente, mas só quem pode decidir é a pessoa ajudada.
A mudança indispensável para a vida do ajudador, é o resultado e o objetivo da relação de ajuda. Para chegar até essa mudança não é fácil e se houver falhas é necessário tentar novamente até alcançar o alvo, sendo que a cada tentativa a experiência aumenta. A transformação deve começar de dentro para fora e mostrar através de ações e às vezes do silêncio ou inércia a diferença que somente as palavras não podem provar.
Quando o ajudado vence seus obstáculos, termina então a relação com o ajudador. Mas o ajudado segue o exemplo do ajudador e se torna seu próprio ajudador e de outras pessoas que lhe pedir ajuda. Porque conviver é uma relação de ajuda.
O livro “Construindo a relação de ajuda” traz palavras sinceras de pessoas que vivem na prática uma constante relação de ajuda. Muitas coisas descritas no livro, embora nem saibamos, já são práticas do dia-a-dia, outras são coisas que não fazemos, mas sabemos que deveríamos fazer.
A sociedade moderna, cheia de veículos de comunicação, metrópoles e pessoas graduadas, possui as contraditórias deficiências de haver pouco diálogo, muita solidão e a ignorância de não compreender o próximo. Em meio a tantas vidas sem esperanças, lares destruídos, amizades desfeitas, vizinhança individualista e há tantos relacionamentos arruinados, temos hoje, como cristãos, o desafio de ajudar alguém, de construir e não destruir trabalhando para a edificação um do outro.
A base para a construção de uma relação de ajuda é o amor. Toda pessoa precisa de alguma ajuda e todos podem ajudar alguém, mas o que vemos são pessoas lutando sozinhas, sendo que se estivessem unidas poderiam vencer. O amor ao próximo pode evitar e solucionar muitos problemas.
É interessante descobrir que muito mais que palavras são os fatos e principalmente os sentimentos. Muitos sentimentos não podem ser respondidos com palavras e muitas ações só podem ser respondidas com reações. Assim, a comunicação corporal tem significado tão importante como a comunicação verbal e embora sem notar, todos utilizam, essa linguagem. O ideal é aprender a observar nos outros a linguagem corporal e se policiar para saber transmitir mensagens edificantes, exercitando esse idioma onde ninguém fala nada mas diz muita coisa.
Ouvir as pessoas, tentar compreendê-las e conversar com sabedoria são virtudes sublimes que precisam ser exercitadas diariamente. Às vezes a carência que as pessoas têm é simplesmente de um pouco de atenção. A vida é tão passageira nesse mundo que não vale a pena ter uma indisposição com ninguém, bom é aproveitar cada instante para viver o melhor possível.
Jesus veio ao mundo para construir a relação de ajuda com o ser humano. Ele perguntava para as pessoas: “O que queres que eu te faça?” e ouvia as suas necessidades. Tocava os “leprosos” ou desprezados pela sociedade, olhando com amor os pobres e com dureza os magnatas. Jesus aconselhava as pessoas dizendo: “Vá e não peques mais”, absolvia do fardo da culpa falando-lhes: “Perdoados estão os teus pecados” e estimulava a uma mudança de vida que partisse da própria pessoa ao dizer: “A tia fé te salvou”.
Por onde Jesus passou, conquistou as pessoas ajudando no que precisasse. Hoje a igreja, corpo de Cristo, continua essa caminhada do Senhor na terra, trabalhando pela edificação do próximo. A igreja é um lugar onde todos se encontram para dar e receber ajuda.
Um fator que impede muito o crescimento dos relacionamentos hoje é a disponibilidade para investir tempo com as pessoas. Mas tempo é uma questão de prioridade. Quanto o mais importante é ser ajudado, todos arrumam uma oportunidade, porém, o inverso acontece quando a questão é ajudar. Isso porque não é notório que a maior ajuda que se pode receber é poder ajudar alguém.
Ninguém vive sozinho, todos têm a todo momento alguém por perto. Na convivência, embora aconteçam tantos desarranjos a melhor opção é construir seja para ajudar ou ser ajudado.
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