
IDE,Pascal. "A arte de pensar". Trad. Paulo Neves São Paulo: Martins Fontes,200.
Em sua obra A
ARTE DE PENSAR, Pascal Ide traz um desafio ao pensamento humano: refletir sobre
sua própria inteligência e raciocínio.
Para um leitor
não habituado a este tipo de texto torna-se difícil a compreensão sendo
necessária diversas leituras e o apoio de outros materiais de pesquisa como um
bom dicionário. Contudo o autor se esforça por ajudar o leitor apresentando
primeiramente em sua tese um sumário com as ‘palavras chaves’ a serem
utilizadas em seu trabalho e ao final de cada capítulo uma série de exercícios
que conduzem o leitor á prática de suas teorias.
O livro é
introduzido com o discurso dos métodos onde o autor trabalha os conceitos do
filósofo francês René Descartes discutindo as quatro leis do pensamento
universal consideradas pelo mesmo. A primeira lei orienta PROCEDER DO CONHECIDO
AO DESCONHECIDO, ou seja, começar sempre por onde já se está habituado para
depois partir para o novo. A segunda lei afirma que A INTELIGÊNCIA VAI DO MAIS
UNIVERSAL AO MAIS PARTICULAR, sendo universal aquilo que é conhecido ou
percebível e particular tudo que é desconhecido ou procurado. A terceira lei
fala da INTELIGÊNCIA EM TRÊS
ATOS, a intuição, o juízo e o raciocínio ou definir, enunciar
e argumentar, conceituando-os respectivamente. A quarta lei declara: TAL OBJETO,
TAL INTELIGÊNCIA combatendo o método único ou matemático defendido por
Descartes e muitas vezes utilizado por muitos estudiosos que acabam se
frustrando por chegar a um resultado errado por não ter pegado o caminho correto.
O primeiro
capítulo disserta sobre o Nível de Leitura que pode ser direcionado às três
grandes faculdades no ser humano: a inteligência, a vontade e a afetividade ou
sensibilidade. Um texto poder ser
escrito dirigindo-se a uma destas três faculdades buscando uma reação correspondente.
Um texto direcionado à inteligência conduz ao saber, se for direcionado à
vontade leva ao mover-se em relação ao tema e se o texto for direcionado à
sensibilidade induz o leitor a se comover ou sentir algo a respeito.
Baseado nisso
pode-se perceber a importância de se auto-analisar antes de procurar um texto
para ter consciência do nível de leitura que se deseja alcançar. Da mesma forma
é possível ao ler um texto detectar qual nível de reação o autor tende alcançar
no leitor.
Um bom texto
poderia contemplar os três níveis, ou então apenas o nível desejado de forma
clara para não confundir o leitor ou decepcioná-lo. Por exemplo, para se falar
de ciência não é preciso comover o leitor, mas instruí-lo. Para divulgar uma
mercadoria é preciso tentar mover o cliente a comprar convencendo-o de sua
utilidade e necessidade do mesmo. E para falar dos sentimentos seria difícil
utilizar conceitos ao invés de fazer sentir o que está sendo dito. Entender os níveis de leitura ajuda o leitor
a escolher um texto adequado á sua necessidade e principalmente a redigir um
novo texto sabendo o nível que deseja alcançar.
O capítulo
número dois, intitulado A PROBLEMÁTICA PROBLEMÁTICA, ensina como descobrir ou
formular a tese de um texto a ser lido ou redigido de forma que ao ler é
possível entender e aproveitar melhor a leitura e ao escrever ser mais claro e
objetivo.
No terceiro
capítulo, O RACIOCÍNIO: JUNTAR FEIXES OU CATAR ESPIGAS? o autor disserta sobre a função e formas do
raciocínio. Assim o raciocínio busca a causa ou origem, unifica as ideias,
formaliza e evita os erros e é formado de diferentes proposições, premissas e
termos ou conceitos, sendo o Termo Médio (TM abreviado pelo autor) o termo ou
ideia que une o predicado e o sujeito da tese podendo ser considerado o
raciocínio ou argumento principal.
Aristóteles
denominou quatro tipos de raciocínios: o silogismo, a indução, a analogia e o
entimema.
O silogismo foi
considerado por Aristóteles o raciocínio mais perfeito. Silogismo é uma dedução
que parte das leis mais universais formando conceitos universais. Apresenta a
causa última de uma coisa. A problemática é demonstrada pela causa ao unir o
predicado e o sujeito, associando três proposições, duas premissas e uma
conclusão. O silogismo pode ser classificado por três espécies de figura. O de
primeira figura demonstra todo tipo de proposição, o de segunda demonstra
apenas ideias negativas e o de terceira figura só conclui em particular.
A indução é um
tipo de pensamento que parte da análise de elementos particulares e tenta
generalizar. Baseia-se experiências isoladas a partir desta faz o julgamento da
tese. É o raciocínio mais frequente e complementa o silogismo porque permite
encontrar provas específicas enumerando casos singulares.
O raciocínio
por similitude ou analogia consiste em ilustrar por exemplos de histórias ou
parábolas o que se deseja afirmar na tese. Embora não forneça a causa é eficaz em persuadir. A
exposição é um tipo de analogia que provoca comparação da similitude de duas
realidades para defender a tese dirigindo-se mais à imaginação e à afetividade
dos que à razão. A analogia pode ser um complemento muito importante para a
tese embora sozinho possa ser refutado facilmente por outra analogia.
O entimema é um
tipo de raciocínio que se baseia em um sinal provável que gera um sentimento e
convence sobre a tese utilizando também argumentos aceitos pela maioria das
pessoas (lugar-comum). Uma teoria ou hipótese é formulada por um entimema, ou
seja, parte de um sinal em busca da causa, uma tese.
O objetivo dos
argumentos é convencer ou persuadir. Os pseudo-raciocínios ou raciocínios
sofísticos não demonstram nem prova a tese. O raciocínio por acidente tenta
comparar fatos ou conceitos do mesmo tema para associá-los, contudo sem
concluir. O raciocino dialético faz um paralelo entre uma proposição e seu
oposto argumentando sobre uma e outra sem dar uma certeza.
Cada tipo de
raciocínio tem seu valor e lugar completando um ao outro se bem utilizados para
defender uma tese.
Uma leitura
muito diferente de qualquer texto acontece depois de conhecer estes tipos de
raciocínios. É interessante notar como o apóstolo Paulo se utiliza destes
métodos, talvez já conhecidos por ele, para defender suas teses. Um exemplo
quase completo que me arrisco em citar é o capítulo 15 da primeira carta aos
Coríntios, onde se dirige claramente à razão dos leitores, defendendo a tese de
ser verdadeira a ressurreição dos mortos e argumenta com indução (v. 3-8),
silogismos (v. 12-22) entimema (v. 9-11 e 29-34) e analogias (v. 35-44), combatendo
insistentemente os pseudo-raciocínios.
Uma terrível
descoberta acontece ao ler este livro: NÃO SABEMOS LER! A leitura superficial
ou pior, o raciocínio superficial tornou-se um vício que precisa ser combatido
tenazmente. Poderia classificar Pascal Ide como um clínico na área, o livro A
ARTE DE PENSAR uma grande receita ou dieta, o exercício prático seria então o
remédio para combater essa doença. Cabe ao paciente escolher se aceita o
tratamento.
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