A Ética da
Esperança de Jürgen Moltmann publicada em 1964,
um texto em perspectiva histórica resumindo seu texto original e depois
apresentando os aspectos relevantes de sua teologia para o pensamento teológico
mundial.
Moltmann declara
a influência que recebeu do filósofo neo-marxista Ernest Bloch com seu texto “Princípio Esperança” e a dívida à
teologia holandesa do apostolado. Além disso, estudou sobre a teologia
dialética de Karl Barth. A Teologia da Esperança representou uma verdadeira
revolução com característica teológico-pastoral que influenciou outros
segmentos como a teologia da libertação latino-americana.
A grande mudança
da obra de Moltmann para a teologia sistemática foi que a escatologia antes
colocada no fim de suas disciplinas passou a ser a essência do estudo teológico
em geral. Para
a teologia dogmática até então a escatologia anunciava o fim da história e a
partir da nova compreensão de Moltmann passou a ser a continuidade e futuro
histórico com sentimento de esperança. A proposta da Teologia da Esperança é
uma nova hermenêutica focada no futuro e uma práxis ética eclesiástica como
esperança para os problemas presentes.
A obra fundante
de Moltmann falando sobre cada um de seus cinco capítulos e aparentemente em
duas partes. A primeira são os três capítulos iniciais com ênfase escatológica
e a segunda parte são os dois últimos capítulos com destaque mais
antropológico. O primeiro capítulo Moltmann trabalha a mudança do conceito de
“eterno presente” para a revelação como promessa futura. No segundo capítulo
volta à história do êxodo para mostrar a intervenção divina na história humana
ensinando a olhar par o futuro. O terceiro capítulo fala da novidade de Cristo
na ressurreição dando esperança até mesmo para a morte. O quarto capítulo é um
estudo escatológico e hermenêutico da história anunciando não o fim desta, mas
o progresso em direção ao futuro. E o último capítulo fala da Igreja e seu
convívio social como geradora de esperança escatológica.
O olhar para o
futuro parece ser os óculos de Moltmann. Sua cristologia é essencialmente
escatológica. A dialética da cruz na morte e ressurreição é interpretada no
sentido máximo não havendo a partir de então limites para a esperança. Em
Cristo até para a morte há esperança porque Ele ressuscita os mortos.
A eclesiologia
da esperança deve ser voltada para o serviço à vida buscando o “ressuscitar
mortos” na sociedade. A igreja deve trabalhar pelo bem comum e sua função é em
primeiro lugar levar o conhecimento de uma subjetividade transcendental que
leve os cristãos a entender o futuro universal de Deus para a humanidade e em
segundo lugar a transcendência no encontro com o próximo enquanto comunidade.
A hermenêutica
bíblica até então trabalhava questões como a prova da existência de Deus por
três tipos básicos de argumentação:
Existencial: Deus é conhecido pelo ser humano no seu contexto
existencial e histórico pessoalmente.
Cosmológica: Deus deve ser entendido a partir de um estudo
completo da história universal de toda a humanidade.
Ontológico: Deus só pode ser conhecido por Deus mesmo e a história
tem sentido querigmático de Deus para a humanidade.
A partir da
Teologia da Esperança a hermenêutica bíblica passou a entender a revelação em
sentido amplo. Deus é conhecido tanto existencialmente, como de formas cosmológica
e ontológica ao se manifestar em tudo e em todos para dar esperança. O
relacionamento com Deus antes frustrado pelo reconhecimento condenatório do
pecado e dos males sociais, ganha aceitação com oportunidade para um recomeço.
A leitura
histórica também mudou. Ao invés de olhar para o passado de forma negativa
vendo os erros da humanidade e desacreditando no presente e no futuro. “Todo
saber torna-se um saber de esperança” em
solidariedade com o passado e sonhando com o futuro. Moltmann chama para um
novo êxodo para libertação de vidas que estão escravas no mal. As instituições
devem ser utilizadas para potencializar vidas para o estabelecimento do Reino
de Deus.
O problema do
futuro humano é considerado o único problema da teologia e do próprio ser
humano. Mas o que é o futuro para Moltmann?
Futuro parece ser o presente com a presença de Cristo num olhar de
esperança escatológica universal. O futuro vem pela manifestação de Deus à
humanidade e esta pode trazer o futuro para o presente ao exteriorizar o
compromisso com o amor ao próximo.
O autor avalia a
contribuição da Teologia da Esperança para a Teologia Sistemática baseado no
pensamento de Thimotheus Rast em
seu Balanço da Teologia do Século X:
Diferenças e transformações
na Teologia Sistemática no século XX
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Nº
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Dogmática tradicional
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Teologia da Esperança
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1
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A escatologia
como último tratado da dogmática;
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A escatologia
passa a ter sentido fundamental para toda a teologia;
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2
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A escatologia
apenas futurística;
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A escatologia
está no presente através de Cristo;
|
3
|
Escatologia
de essência;
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Escatologia
da existência contemplando toda a natureza;
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4
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Ênfase
escatológica eventos, fatos ou lugares;
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Ênfase
escatológica na pessoa de Cristo (escatologia cristológica);
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5
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Insegurança
com respeito à salvação;
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Confiança em
Deus como único Juiz e conhecedor do destino humano que julgará com justiça;
|
6
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Conceito de
salvação individual;
|
Conceito de
salvação da escatologia universal;
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7
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Conformismo
com o presente e espera tímida pelo futuro com a interrupção da história.
|
Motivação a
agir atualmente em favor do futuro com todas as instituições para o bem
comum.
|
Alguns autores influenciados
pela Teologia da Esperança:
- João Batista Libânio: “o
cristianismo “é total e visceralmente escatologia””
- Gustavo Gutiérrez: “a perspectiva
escatológica atual... é marcada por uma incidência clara e enérgica sobre o
político, assim como sobre a práxis social”
- Rubem Alves destaca a importância do pensamento de Moltman embora com
algumas críticas, assume muitos conceitos da Teologia da Esperança.
- José Miguez Bonino: “a história é
o ‘sacramento da ética cristã, não apenas o seu material’;
- René Lauentin valoriza o trabalho de Moltmann por um cristianismo
comprometido com os problemas temporais;
- Heins Zahrnt destaca a valorização do futuro na Teologia da Esperança
como dimensão essencial para a fé cristã;
- David Scaer reconhece o trabalho de Moltmann por restaurar o lugar
correto da escatologia e sua função como chave para entender a teologia em sua
totalidade.
Além do texto Teologia da Esperança Moltmann também
escreveu outro contemporâneo a este chamado Deus na Revolução onde não trata a escatologia de modo
tão transcendentalista considerando de modo otimista o futuro da consciência
moderna. O texto é escrito na dialética histórica presente-futuro onde o
próprio ser humano pode transformar a ordem social por ele estabelecida mesmo
que já tenha fracassado.
Numa avaliação
crítica da Teologia da Esperança existem alguns problemas na obra de Moltmann:
- seu exclusivismo confessional revelado no sentido querigmático de seu
ensino inspirado em Barth;
- seu entusiasmo positivista na “paixão pelo possível” deixando de
avaliar pontos negativos na história;
- a falta do envolvimento humano no processo esperando somente um evento
cristológico para a restauração da humanidade;
- a espera pelo futuro que dá esperança solidária ao povo, mas é passiva
dependendo somente da obediência até que Deus recrie todas as coisas;
- uma linguagem escatológica que “nega a realidade presente de modo
radical” esperando somente na ressurreição de Cristo como argumento da
esperança;
- falta mais argumento histórico e humanista e excesso de argumentação
bíblica e espiritual que só pode ser aceita pela fé;
- forte expectativa na missão dos cristãos principalmente na pregação e excluindo
a participação do restante do mundo;
- rejeição ao apoio de outras ciências além da teologia como a filosofia
histórica e da antropologia filosófica;
- uma transcendência que coloca Deus fora da esfera histórica, terrena ou
humana por ser pecaminosa;
- uma negação do passado ignorando também o presente e esperando somente
no futuro;
- o papel da igreja passa a ser além de humanizar as pessoas pela
pregação bíblica, perceber o possível e o futuro na história;
Moltmann, quanto
à ação de Deus sobre a história acreditando que Deus age através da humanidade
em sua história com suas estruturas racionais e lógicas da mente. Cita como
exemplo a encarnação de Jesus que veio e se inseriu na humanidade assumindo
papel histórico para anunciar o futuro de Deus. Para o autor uma teologia que
não parte da realidade por pior que seja pode gerar esperança, mas também pode
causar frustração. Por isso prefere assumir a escatologia do ‘já’ e ‘ainda não’
ao invés do tudo ou nada em relação à ação de Deus na história.
Segundo o
pensamento de outros autores como de Gutierrez que afirma ser perigoso fazer
uma teologia que não tenha à frente a realidade. Kar Rahner observa que a
apocalíptica desvaloriza o tempo e a história, já a escatologia reafirma a ação
de Deus com participação humana na história. Ernest Bloch fala da transformação
do mundo a partir da percepção do horizonte das possibilidades. Paul Tillich
acredita que a própria história se dirige para a realização escatológica com
vitória sobre a morte e o ‘ser’ é potencializado pela capacidade de transcender
a realidade através da práxis cristã.
Concluindo, é possível
fazer um balanço crítico sem querer
chegar a uma conclusão porque somente com o tempo seria possível fazer
isso. Indica três passos para o estudo da teologia: primeiro verificar que
futuro tiveram as instituições que assumiram a Teologia da Esperança e o
próprio pensamento de Moltmann se pôde se manter frente as adversidades. Em
segundo lugar comparar com outros teólogos que seguiram esta corrente como uma
escola teológica. Em terceiro estudar sua influência sobre a teologia
latino-americana.
Os escritos de
Moltmann têm um aspecto prático pastoral claro e foram formados para falar à
comunidade em que pastoreava. Seu pensamento permanece coerente e cresce de
forma organizada em direção às necessidades do povo sempre numa perspectiva de
esperança.
Sua obra O Deus crucificado de 1972 é uma
continuação reparadora dos aspectos mal entendidos da Teologia da Esperança
mantendo a mesma essência, contudo com direção mais trinitária. A tarefa
política da igreja é esclarecida como uma função crítica contra os sistemas de
crucificação e à favor dos ‘crucificados’ anunciando a estes a ressurreição da
esperança.
Esta obra foi
muito criticada por teólogos latino-americanos como Gutiérrez, Rubem Alves e
principalmente Míguez-Bonino gerando tensão entre a teologia européia e
latino-americana. Até então a teologia moderna ainda não tinha visto uma
discussão aberta entre teólogos renomados principalmente quando parece até
mesmo ser pessoal. Uma teologia que demonstra esperança de um lado e libertação
de outro deve ter como mediador o amor que permite haver diferenças de opinião
sem qualquer sentimento de rancor.
No texto Igreja na Força do Espírito de 1975 Moltmann faz um tratado de eclesiologia messiânica
chamando a Igreja a refletir sobre a morte e ressurreição de Jesus como
sentimento fundante de sua missão. Trata a Igreja e sua função do ponto de
vista serviçal na política, economia e sociedade e também espiritualmente
através dos sacramentos, da oração e pregação do evangelho. A Igreja assume
posição mais ativa participando do reinado de Cristo lembrando-se do Cristo
crucificado e anunciando esperança baseada na ressurreição. Quem sofre, ao ver
o sofrimento de Cristo, tem esperança pela mensagem de sua ressurreição.
Houve um período entre 1975 e 1980 e
depois numa segunda fase da carreira de Moltmann ele tenta sair um pouco da
dogmática para um diálogo mais espontâneo visando apoiar pastores, professores
e estudantes de teologia. As mudanças do pensamento de Moltmann não
foram muito grandes embora tenha sido mais abrangente em seus temas abordados.
Como prometido o
balanço termina sem conclusão clara do texto embora tenha valorizado o trabalho
da Teologia da Esperança e lamenta que já esteja sendo esquecida no passado
desejando que seja reconstruída por seu valor prático e motivador da fé cristã.
Sem dúvida alguma o legado teológico de Moltmann é marcante em sua geração
principalmente por seu significado pastoral, ético e sociológico. Teve a
habilidade de unir teologia e prática, ciência e piedade, mente e coração...
“fé, esperança e amor, estes três, porém o maior deles é o amor” (I Coríntios
13.13).
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